terça-feira, 30 de dezembro de 2014
terça-feira, 23 de dezembro de 2014
A Consoada.
Conto de Natal.
(Porque a vida não espera, e Natal são todos os dias do ano...)
Recostado numa confortável poltrona olhava a parede branca
sem pestanejar, alheio ao cirandar da mulher, que ultimava os preparativos para
a ceia de Natal, tal como nos anos transactos iriam ter a casa cheia. Os filhos
trariam as noras que por sua vez trariam os pais e irmãos, e assim ano após ano
a família aumentava a olhos vistos. Viriam também os irmãos, os avós e alguns
primos e primas. Enfim, uma verdadeira consoada em família, tal como mandam as
regras da boa convivência.
Olhava a parede onde sustido por uma vistosa fita vermelha
pendia um velho e muito valioso retrato de família, que a mulher nessa manhã tinha
esconjuntado do fundo de um baú, guardado há séculos no sótão do robusto
casarão que era morada de ambos. Ao colocar o quadro na parede ela não perdera
tempo e sublinhou ´´ a partir de hoje fica aqui, assim ninguém nesta
casa esquecerá novamente que somos uma família e como tal que prevaleça a
lealdade``.
Na altura não havia ligado às palavras frias da mulher, há muito
que se habituara a ouvir sem ouvir. Ou melhor, ouvia mas não lhe atribuía valor
algum. Se assim não fosse há muito havia enlouquecido.
Estavam casados para mais de trinta anos, desse casamento
haviam nascido quatro filhos, cada qual com a sua vida organizada longe da casa
paterna, e assim acabaram a repartir o espaço numa coabitação umas vezes morna
outras vezes gélida, no icebergue que é uma união onde o amor há muito
desapareceu. Se é que o houvera algum dia, sente que talvez tivesse havido uma
amizade, ou um interesse comum, porque o calor de uma paixão nunca sentiu pela
mulher nem ela por ele, com o nascimento dos filhos cada um direccionou o
interesse pela carreira, numa ânsia tresloucada para acumular sempre mais e
mais. Para eles, amor era dinheiro na conta bancaria. Esqueceram ambos que o
amor é feito de contacto, quer físico quer espiritual. E hoje ambos a meio
caminho da velhice chegam a ter náusea um do outro.
´´ Que ninguém se esqueça que somos uma família`` martelavam
as palavras na sua cabeça. Que família, a família dos dias santos, ou a família
das disputas onde um tentava sempre humilhar o outro e levar a vantagem nessa
humilhação, mau viver tal, que afastava os filhos e os netos da sua
convivência.
Levantou-se ao ouvir a campainha e encaminhou-se para a
porta da rua que abriu pesaroso.
- Boa noite pai, eram os filhos que chegavam
trazendo atrás de si os restantes.
- E ela, perguntou a filha mais nova, - vamos
ver se este ano a festa não acaba em amuo.
- A tua mãe está bem, descobriu que afinal
somos uma família.
- Ah, ainda vai a tempo. Quem sabe tenha
descoberto também que para além de família, todos tem direito a uma opinião, ou
a opções próprias, e principalmente que não existem vítimas, cada um tem a sua
dose de responsabilidade na harmonia familiar…
Após a farta ceia, ele sentou-se novamente na confortável poltrona
olhando os netos que desembrulhavam os presentes de Natal, por entre as suas mãos
geladas tremelicava um envelope que a neta mais velha lhe havia oferecido,
lentamente o abriu e do seu interior retirou um bilhete de comboio.
- É a nossa prenda pai, tens direito a viver o
que nunca viveste, tens direito a ser feliz. E para isso só precisas de um empurrão,
a vida não espera pai. Os filhos em coro.
- E ela, olhou a mulher.
-A avó também tem direito a um, mas com
destino diferente para sermos uma família não precisamos do teu sacrifício, eu
vou viajar com ela. Apressou-se a neta a responder.
Olhou o velho retrato, onde os filhos ainda crianças lhe
sorriam, depois encaminhou o olhar para os homens e mulher na sua frente, que acabaram de
lhe transmitir a esperança numa verdadeira consoada.
domingo, 21 de dezembro de 2014
Feliz Natal...
Luzinhas a saltitar
Pirilampos de luz e
cor
O Pai Natal a sonhar
Que no mundo já não há dor
Este sonho eu vou transpor
Para um mundo de magia
Com muita paz e amor
Muito riso, muita alegria
Até um simples bom-dia
Eu posso encher de luz
Lembrando Jesus que sorria
Estando pregado na cruz
Minha prece se traduz
Num presente requintado
Um pacote de paz e luz
Para um mundo conturbado
Versos de 20-12-2008.
O Pai Natal a sonhar
Que no mundo já não há dor
Este sonho eu vou transpor
Para um mundo de magia
Com muita paz e amor
Muito riso, muita alegria
Até um simples bom-dia
Eu posso encher de luz
Lembrando Jesus que sorria
Estando pregado na cruz
Minha prece se traduz
Num presente requintado
Um pacote de paz e luz
Para um mundo conturbado
Versos de 20-12-2008.
quarta-feira, 17 de dezembro de 2014
terça-feira, 16 de dezembro de 2014
Espanto...
A míngua de
olhar ergue muros,
alcoolizada
pode ser a cegueira…
Brado arrancado
ao sussurro
De um coração
em espanto …
Que é isso
afinal? Perdurável sensação,
que ao dar
se nega o ter, no ser de agora,
que é isso
afinal?
Tumulto de
um dia não,
fechado na
mão, oh não…
Não. Não gastes
saliva em vão.
Escasseia na
palavra amor a garra,
crença elevada
em brado.
Escasseia
nos corpos nus,
nas mentes
fechadas,
até nos
lábios unidos…
A míngua de
olhar ergue muros,
decorados a
bolas vermelhas!
Não fossem
as luzes brilhantes,
e ficavam
por lavrar,
palavras de
amor.
segunda-feira, 15 de dezembro de 2014
A Velha Pasteleira ( Conto de Natal )
Naquela manhã o branco das paredes afigurava-se mais branco,
emoldurado pelo sol matinal de um dia de Inverno, por entre as pedras da
calçada que os seus pés pisavam, em passos pesarosos mas controlados pelo peso
da velha pasteleira, nasciam a medo galrachos, ervas daninhas difíceis de
controlar, até nos passeios da aldeia.
Desconhecia, ou fingia desconhecer que era manhã de Natal, um ou outro
transeunte esporádico que com ele se cruzava quase sempre baixava a cabeça, enquanto
o cumprimentava num carinhoso bom dia. Assim acontecia todas as manhãs, ia para
mais de quinze anos, quando naquele dia fatídico um AVC lhe tolhera para sempre
os movimentos, ficando ainda assim com capacidade de locomoção vagarosa, fez
então da bicicleta a sua bengala, e passou a percorrer as ruas da pacata aldeia
alentejana todas as manhãs, quer fizesse sol ou chuva. A conselho do médico que
o havia avisado, ou se habituava a andar a pé, e a comer com moderação, nada de
fritos ou enchidos, e doces só de vez em quando, tinha também que cortar no
tabaco e no copito de vinho que eram o seu consolo, ou ia desta para melhor,
não restavam dúvidas.
Havia saído de casa, eram mais ou menos oito horas da manhã,
sobressaltou-se com os lamentos do sino da igreja a anunciarem as nove horas,
em compassadas badaladas. Como era possível só ter percorrido duas ruas e já
ser tão tarde. As suas pernas cada vez mais cansadas ficavam a cada dia que
passava, mais e mais preguiçosas, mas como era burro velho jamais lhe levariam
a melhor, o coração também já não ajudava, e às vezes implorava a Deus para que
o chamasse a si, ali, nas pedras do velhinho passeio, por entre os malditos
galrachos. Logo os pensamentos de morte, deitava para trás das costas, como se
atrevia a desejar tal coisa se a sua menina precisava tanto dele.
Apressou o passo de volta a casa, como se isso fosse possível, porém a
sensação de andar mais depressa trazia-lhe aos lábios um sorriso, e a lembrança
dos olhos negros que o esperavam em casa deixavam-no mais jovial. A sua menina
era a luz dos seus olhos.
- Bom dia
Amélia, está um dia lindo.
Cumprimentou-a ao entrar no quarto. Tinha encostado a pedaleira
religiosamente a uma das paredes do corredor que dava acesso à casa. Esta
ficava por detrás de um velho armazém de cereais, agora sem vida mas que em
tempos deu de comer a nove empregados e suas famílias. Sinais dos tempos
modernos e da crise que assolou a vida de muitos. Com ele as coisas tinham sido
diferentes, com a doença foi obrigado a fechar o negócio, como descendente um único
filho de que há muito perdera o rasto. Havia o Emanuel, assim se chamava o
filho, cruzado o oceano em busca de aventuras, que o dinheiro do pai proporcionavam,
e um dia nunca mais chegaram notícias. Acreditava que o filho estava vivo, ao contrário
do pessoal da aldeia que há muito o enterrara. Como não estava para que o
apelidassem de velho louco, nas poucas conversas que mantinha sobre o assunto
com algum vizinho, rematava sempre – se o meu filho fosse vivo. Ou então - paz
à sua alma.
- Então minha menina, hoje não
cumprimenta o velho pai.
Ficou sem resposta, mas ia jurar que ela lhe sorrira. Como se não
bastasse o maldito AVC, e o desaparecimento do filho pelas estradas da vida,
brindara-o esta com a doença da mulher. Alzheimer, a maldita doença que tolhe a
memória, e aos poucos a sua menina foi ficando cada vez mais menina, nem sequer
se lembrava de ter sido mãe.
Por entre os pensamentos a vestiu e a sentou na cadeira de rodas, que
empurrou a custo para junto da velha chaminé. Onde ardia um garboso madeiro de
azinho, protegido por uma sólida grade de ferro fundido. Não fosse o diabo tecê-las
e a sua menina cair ao lume.
Estava o tio Horácio a tentar convencer a mulher a engolir as sopas de
leite do pequeno-almoço, quando umas pancadas secas no velho portão da entrada
lhe chamaram a atenção.
- Espera um pouco, vou ver quem é, não saias
daqui.
Pediu ao sair para o corredor, frio e desnutrido de vida. Ainda afagou
a velha pasteleira ao passar.
O homem que o portão escondia, tremia que nem varas verdes, não tanto
pelo frio e sim pela saudade.
- Bom dia…
Balbuciou o velho olhando-o intrigado, iria jurar que os olhos pretos
por detrás das grossas lentes não lhe eram estranhos, tentou adivinhar as
feições que a branca e farta barba escondia, mas o seu coração de velho
conteve-se.
- Bom dia, pai. Feliz Natal.
Estão agora os três, sentados em frente do braseiro, até os madeiros
mais robustos, sucumbem às labaredas, e eles quase sucumbiram à vida e à distância,
porém Deus acaba sempre por escrever certo por linhas tortas, e quem sabe sejam
as dores o verdadeiro inferno, mas a esperança traz sempre uma nova aurora.
No dia seguinte talvez ganhasse coragem para conversar como filho sobre
tão longa ausência, mas era dia de Natal e no Natal é tempo de viver.
Até a sua menina cantarolou, aquela cantiga de embalar com que adormecia
o filho, quando bebé. Porém ao terminar perguntou com um brilho maroto nos
olhos pretos.
- Vocês os dois, quem são?
O Pai e o filho olharam um para o outro e foi o velho pai que respondeu.
- Ninguém, somos ninguém, e ao
mesmo tempo somos duendes, existimos para que tu sorrias.
Ela deu uma gargalhada. Ao longe, na praça da
aldeia o sino redobrava a Ave-Maria, assinalando que já era meia-noite.
E Jesus nasceu.
Antónia Ruivo, Dezembro 2014
Foto: Antónia Ruivo.
terça-feira, 9 de dezembro de 2014
Gosto de sair para a rua. (Crónica do esquecimento).
Como mulher ligada às letras gosto de sair para a rua, e este sair para a rua levaria o leitor a pensar que gosto de bater perna por aí, ao sabor da descoberta. Pode ser que sim, pode ser que não.
O facto, ou o ´´fato`` que a concórdia recente em volta da língua mãe e que me salta à vista em tudo o que é escrito nas bancas de jornais, ou nas telas televisivas, mas que eu e uns quantos revolucionários linguísticos teimamos em ignorar. A bem dizer, aqui o termo revolucionário transporta um sentido antagónico à coisa. E arrisco assim meia dúzia de olhares de esguelha, pois li algures por aí mais ou menos isto. Que o acordo é tão-somente um salto no futuro, tudo é mutável, e revisões à língua materna tem vindo a acontecer esporadicamente ao longo dos tempos, rematava o artigo com uma reflexão muito bem elaborada, por sinal, sobre a origem do latim e a sua influência na língua portuguesa ou no galaico, assim como o salto para o actual português, que não vem agora ao caso, de Latim não percebo patavina.
Por isso mesmo adiante, o facto é que o tempo urge e conversa que se perde nas entrelinhas numa ânsia de perdurar, normalmente é sol de pouca dura. Assim sendo dou asas aos pensamentos numa tentativa de que o meu ´´latim`` não vá por água abaixo. Tal como as aspas que gosto de utilizar nos textos que escrevo, e que às vezes se perdem em contramão no Facebook, e volta e meia lá vem uma alma caridosa elucidar-me que esta ou aquela palavra caiu em desuso, ou que é gíria, outras vezes que é lastimoso que eu, logo eu, que tenho a mania que sou escritora não tenha cuidado redobrado com os termos utilizados naquilo que quero transmitir. Será de bom-tom informar, que normalmente o faço com a noção perfeita do efeito que determinada frase ou palavra em desuso terá no leitor. Imodéstia minha, assumo, é tão-somente a minha contribuição para que a lembrança não falhe.
A lembrança, ou ´´alembradura`` alcançará o auge se se souberem preservar memórias, e claro está, a língua é e sempre foi a nossa memória palpável.
A ´´ alembradura`` é para aqui chamada porque frequentemente a ouço a rapazes e raparigas enquanto esperam o autocarro, na praça fronteiriça á minha casa, e dou por mim a rir a bandeiras despregadas do português que os miúdos de agora falam. Sem que deixe de ficar estupefacta com o papel da escola para que assim seja, este meu estado pasmado deve-se à memória bem latente da palmatória da professora Rosário Maltez, a cada facada que eu dava na língua mãe.
Voltando ao sair para a rua, gosto de sair para a rua, de me perder nas conversas alheias, estou mesmo a ver, lá me vão acusar de cusca. E conseguiria eu colocar alguma coisa no papel se assim não fosse?
Para terminar apraz dizer que tenho saído para a rua nas últimas semanas, e que apesar das luzes natalícias não cheira a Natal, as conversas não cheiram a Natal.
Cheiram a velhice, a ordenados em atraso, a crise nas pedreiras e nos outros sectores da economia, cheiram a angústia.
Mas como sou cusca e acima de tudo inconformada, gostava de ter saído para a rua e que as conversas mais ou menos intelectuais tivessem descaído na última semana no Ranking das Escolas 2014 e do resultado da escola que a minha filha frequenta, constar nos últimos lugares da lista.
Coisas que a ´´ ALEMBRADURA`` das conversas estudantis enquanto esperam pelo autocarro me traz à ´´ MIMORIA``
Gosto de sair para a rua e de ouvir, mais do que conversar, gosto de sair para a rua e de ouvir os desconhecidos, bem mais do que aqueles que tal como eu se julgam intelectuais.
Só assim as palavras que escrevo têm algum sentido.
Dizia-me um dia destes um antigo professor, ao ser-lhe apresentada por um amigo.
- Ah, escreve poesia, espero que saiba transmitir alguma coisa naquilo que escreve, senão não vale a pena.
Respondi, -acho que não sei escrever palavras bonitas aos olhos de quem lê-.
Olhou-me incrédulo, como quem diz.
´´ Pois sim``…
Antónia Ruivo.
Peças de Xadrez...
-Não desistas de mim- imploraram teus olhos
de mel.
Instante denegrido
pela sofreguidão do domínio.
-Não desistas- como se palavras fossem adagas,
do ser…
E o medo não
matasse o viver.
Sentenças arremessadas
a preceito. Pano que tenta cobrir o mundo.
Um mundo,
que não extingues…
Preguiça sobranceira
onde insistes!
Ou não fosse
o coração terra que ninguém pisa.
- Não desistas de mim- pediram os teus olhos
ao início do Outono.
Rogaram novamente
ao despontar da Primavera.
E no calor
do Verão soterraram ambições! Estio propício ao engano.
Como se
desistir, não fosse cartas de baralho viciado,
Ou peças de
xadrez mal jogado! Onde o peão a reboque da dama
Empedernisse
o rei…
São os teus
dias cinzentos… Olhos paredes meias com nada.
Não desistas. Ou todos os sonhos serão
restolho com morrinha
Sou eu que
te digo. Eu, na vida fuinha.
Natal fecundo...
Onde pernoita
a esperança. Porém é triste
O teu olhar
criança. Quisera que sorrisse
O negro das
vestes pintalgadas de borboletas.
E voassem
Aladino`s nas suas parcas asas,
Ou não fosse
o teu sonho templo que resiste
À loucura
humana. Criança mulher aliciaste
A minha pena
insana. Ai tristes palavras…
De poeta inglório.
Quero dar ao mundo
Retalhos de
luz, quero dar ao mundo fantasia!
Mas tudo é
tão negro, de esquiva alegria.
Quero dar ao
mundo um Natal fecundo,
Recantos sem
sombra num leito com alma.
Ambiciono dar
ao mundo… Crianças com vida.
quarta-feira, 3 de dezembro de 2014
Ser feliz...
Dou pelo
amor, horas calmas...
É lá que pernoita a vontade!
Mas; desliza singela pela correria...
É lá que pernoita a vontade!
Mas; desliza singela pela correria...
Ou na desventura da cegueira.
Esguio é quase sempre o salitre,
no rodapé do silêncio!
Esguio é quase sempre o salitre,
no rodapé do silêncio!
Dou pelo
amor em fracções de segundo...
Resvala submerso
no nó da garganta.
Atrofia
a vontade onde a lágrima jorrada:
Não passa de
bulício em aflição!
E assim dou
por mim a pensar:
Quanto ingrato
é o medo de amar.
Ou a vontade
de abraçar!
E assim dou
por mim a pensar:
Que a pena
sentida é sombra...
Escarpada na
ignorância,
de ser
feliz!terça-feira, 2 de dezembro de 2014
Comentadora de bancada. (Crónica)
Passo muito tempo comigo a sós, muito desse tempo é gasto
com a poesia, mas de vez em quando há uma frase, situação, ou estado de alma que
promovem um recolhimento em torno da mulher que sou enquanto poeta, e sobretudo
enquanto cidadã de um país envolto no desgoverno social. Todos sabemos onde
pairam os culpados desse desgoverno, melhor seria e melhor viveríamos se assim
não fosse.
Com o passar dos anos e com um percurso de vida que me levou
do berço rural para o reboliço de Lisboa durante duas décadas, sei que aqui há
meia dúzia de anos atrás ainda estava convencida que sozinha conseguia mudar o mundo,
a meu bel-prazer, e o pior de tudo é que às vezes achava que se determinada
coisa fosse boa para mim por acréscimo seria boa para todos.
Quero chegar com a conversa ao dia em que decidi mudar o
mundo numa pequena vila do concelho de Montemor-o-Novo, e candidatei-me à junta
de Freguesia de Santiago do Escoural como independente nas listas do PS. Foi na
lista do PS como poderia ter sido na de outra força politica qualquer, tinha é
que ser da oposição. Convém dizer que embora estivesse convencida que tinha
capacidade para mudar o mundo, sabia perfeitamente que ser politico neste país
algumas vezes é somente achar que ser diferente, ter ideias diferentes,
trabalhar de forma diferente, basta que a árvore ao ser plantada fique dois ou três
milímetros, ou mais para a esquerda, ou mais para a direita, e que assim o
trabalho executado prima por essa mesma diferença. Há muitos anos vesti uma cor
política mas também há muito tempo que optei por olhar de fora os partidos.
Não ganhei a eleição e vi-me na cadeira da oposição numa
pequena junta de freguesia, no meio rural alentejano, eu, a cidadã que achava que
mudar o mundo era tão fácil, até ao momento em que me defrontei com a realidade
dos números e comecei assim a descer do meu patamar elevado, dei por mim a olhar
com outros olhos a luta de quem está à frente das instituições no meios rurais,
onde os orçamentos e as verbas disponibilizadas são digamos, dadas por cabeça,
eu explico, quanto maior o número populacional, maior as verbas que chegam de
Lisboa. Durante quatro anos fiz oposição, muitas vezes votei contra, com o que
achava estar mal, mas muitas mais vezes votei a favor com respeito pelo
trabalho desenvolvido em prol da população, à custa de muitas horas depois de
um dia passado no seu local de trabalho, o executivo da junta trabalhava o
melhor que sabia para gerir os fracos recursos que eram de todos nós. Também aconteceu
meterem os pés pelas mãos na caça ao voto durante esses quatro anos, para isso
serve a oposição, com respeito e bom senso entre ambas as partes, porque se a
roda virar de rumo também ela, oposição, entrará pelo escaparate da caça ao
voto, não tenhamos ilusões.
Não sei muito bem porque me lembrei disto agora, talvez seja
porque estou cansada e como eu a maioria da nossa população, de ver políticos,
uns de trazer por casa, como eu, outros a nível nacional, atirarem para a praça
pública promessas impossíveis de cumprir perante a realidade financeira de
Portugal. E o pior de tudo, de ver a roda-viva em que algumas pessoas entram
com a demagogia eleitoral, ao vestir a camisola desta ou daquela promessa
politica.
Como estou cansada decidi hoje ser também eu, comentadora de
bancada, e faço desta crónica à semelhança do que fiz em anos anteriores o meu
apelo de Natal. Desta vez um apelo mais generalista, todos vós que me lêem com
alguma regularidade, em poesia ou em prosa, sabem que em quase tudo o que
escrevo sou movida por um olhar crítico em relação ao meio, não me assumiria
poeta se assim não fosse.
Que se deixem de lado guerras e guerrinhas, que se unam as
vontades, que haja respeito pelas opiniões contrárias, mas sobretudo que se
saibam unir esforços em prol das gerações futuras.
Só assim Portugal deixará se estar na cauda da Europa, só
assim se começará a ter vergonha ou orgulho novamente.
quinta-feira, 27 de novembro de 2014
Cante...
Na tua dolência
estival, pedaço de chão maior,
Corres na
cauda do vento numa esperança soalheira.
E num azul acordar,
um hino em ré menor,
Deslizas numa
samarra, numa lua aventureira.
Esculpido na
terra virgem Alentejo é o louvor
Dos que
transportam no sangue o verde de uma azinheira,
E a paz dos
descampados se assemelha a trovador,
Com seu
cante nos embala em voz fresca a cantadeira.
Que canta
mano a mano com homens de tez morena,
Passos lentos
vão pisando as pedras nuas da rua.
Em voz grave
todos cantam modinhas ao por do sol,
No peito bordada
a oiro brilha a Pátria, seu farol.
quarta-feira, 26 de novembro de 2014
Se o poema não sangrar...
No dia em
que o filho da P…ta não sangrar
Deixarei em
paz os empedernidos.
Nesse dia,
fecharei em cova rasa a poesia
E dançarei
na praça ao som da liberdade.
A minha,
muito minha Liberdade.
Partirei ao
meio o lápis par a par
E os
cadernos bolorentos
Em todas as
rimas sem maresia.
Passarei a
viver da vaidade
Acumulada na
verdade.
Muito minha…
Nesse dia as
filhas sem pai
Deixarão de
se prostituir
Junto das
filhas amadas.
E os bons
rapazes serão varões
Gerados nos
colchões
Sem povo.
Serei então comida
pelos bichos
Também em cova
rasa mas fecunda
Que terá na
lápide desenhada a giz.
Às vezes...
Às vezes
acho todas as palavras desnutridas
Todas as
pretensas obras de arte iludidas
Despidas de
sentimentos.
Às vezes
acho os poetas tão chatos
E as
crianças tão traquinas
As pedras da
rua, penso…
Serão ´´astros``
tombados com falta de ar
E os versos
ou as frases, falta de mar
Em terra sem
destino.
Às vezes
acho que sou abissal
Com um olhar
informal.
Outras que
sou o diabo à solta.
Às vezes não
tenho paciência…
Nem para
ler, queria morrer
Ao empanturrar-me
de letras.
Depois digo
de mim para mim.
Desliga o
botão… logo ali tropeço
Em versos e
reversos sem miolo.
Às vezes
acho os poetas tão chatos!
E coloco o
pé bem no cimo do bolo.
Dou por mim
engolindo a cereja
Tal criança
sem limites.
Assombro...
Caiu na rua
o assombro, preso nas folhas de Outono!
Houve gente
abismada, um sururu, intragável.
E nas pedras
da calçada até ruiu o bordel…
Saiu à rua o
assombro. O Rei caiu do trono!
Pergunto neste
dia, em que às vezes tenho sono.
Serão os
cães ventania, as palavras carrossel,
serão os homens,
feras famintas a granel…
Ou então; chegou
o fim dos tempos. Mono...!
Ou macacada
ilusória num reino de meio sem ponta…
Jaz
estendida na montra de uma qualquer baiuca!
E depois adivinho-me
barata tonta.
Nada será igual! Tudo nasce e desponta.
Mas... mais
dia, menos dia, logo cai a peruca.
Resta acreditar
que o amanhã é que conta.
quarta-feira, 19 de novembro de 2014
Amor...
Não cantes
Pátria inglória
Berço de
poetas tresloucados
Esquece na
valeta a tua história
Da bandeira
esfiapa os brocados.
Não cantes
em voz dolente
Amor, ou a
cor dos sentidos.
Renegas num
fado miserável
O povo e
seus gemidos!
Não cantes Ave-marias…
Quando todas
as Marias
São Marias
em desgraça.
E os Maneis…
Carcaças que
mendigam na praça.
Não cantes,
não te atrevas…
Repara no
muro dos lamentos
Ou então…
Nos rostos
quando cantas,
AMOR, AMOR,
AMOR!
Engolido nas
gargantas
Dos que tem
fome.
Foto: Alfredo Cunha
terça-feira, 11 de novembro de 2014
Amei...
Amei por
entre as flores da primavera,
Sem espaço
p`ra chorar a desventura!
Pois quem
ama exalta ou desespera,
Igual à
sorte que perdura na candura.
De um beijo
ao luar. O jus de uma quimera,
É quase
sempre a ponta de ternura.
Que nos
empurra ou degenera,
Em noite
clara envolta na loucura!
De dois
corpos cansados no viver…
Ou então, caminhos a par, insurreição.
Será o amor uma
leitura a aprender.
Ou será simplesmente
certeza e o prazer,
Que na morte
nos embala, a perfeição…
De que amar é
vida além sorte a acontecer!
quarta-feira, 5 de novembro de 2014
Se nada vês…
Partindo do
princípio que nada sabes.
Então o
porquê que assola,
O meu
coração quando abres
A porta ao sentir
na esmola.
Minutos
inacabados que deixaste
Atrás.
Se nada
sabes ou sentes.
Porque
gritam os teus olhos
Contigo a
sós!
Porque moem
os meus sentires
Igual a Mós.
Talvez
porque a terra é redonda
E o tempo
atrás exista,
Numa era
recôndita.
Esta vida
seja uma partida.
Partindo do
princípio que nada vês
Além do dia-a-dia
sem sal.
Então porque
choras e não crês
Num destino
ancestral…
Ao Ler...
Existem coisas
que não entendo, recuso entendimento.
Palavras truncadas,
acções exaltadas em passos trancados.
Que saber…
Para que
serve a amputação do verbo, se tudo é simples,
em letra ligeira.
Ou então
floreados descabidos do cerne…
Existem coisas
que não entendo, nem me esforço,
guardo o
alcance para o que vem a seguir.
Vaidade minha,
esta falta de entendimento,
Cuido dela
ao dormir ao relento, por entre as gentes!
Numa terra
sombria a raiar de sol!
Embrenhada na
sombra que as ovelhas procuram…
Ai… tão
estranha forma de ser em formato gasto p`lo sal,
que as
memorias brotam sem vergonha! E depois não entendo…
Recuso entender
arabescos floreados no ler.
terça-feira, 4 de novembro de 2014
Simples… Prosa Poética.
Simplicidade,
essa palavra singela que desliza enrolada nos dias,
sobrevoados por
sonhos, onde os receios dormem.
É tudo tão
simples e tão complicado!
A minha e a
tua mente paredes meias no ser, afastadas nas firmezas.
Deslizo segura
na minha insegurança, deslizas tu inseguro na inseguridade…
Tua
companheira de horas mortas, tão torta mas tão segura.
Deslizo sem
medo pelo sentir que assumo. Deslizas com medo de perder.
Tão simples
quanto isso. Simples como só os simples conseguem ver.
Perguntam certezas
ancestrais. – Será simplicidade arrogância?
Respondem inseguros
e marginais os sentidos.
- Sobranceira é a certeza, simples morte dos
sonhos.
Então do que
falo afinal se nem eu entendo, entenderás porventura…
O amanhã que
espera frio e cauteloso, porque agora com naturalidade,
o amor fica
guardado no baú das proezas.
É tudo tão
simples e tão complicado, como se dois e dois não fossem vinte e dois.
Como se
morrer e viver não fosse tudo igual.
A morte de
um sonho pode ser a vida de um novo despontar!
Simplicidade
palavra fácil mas que invertes quando omites o ser.
Simplicidade
na arrogância com que vasculho o teu querer.
E então,
então… estarão de mãos dadas a singeleza e a soberba,
com que nós
dois vivemos de costas voltadas.
Sombras… Prosa Poética.
para o teu
olhar aguado, onde pernoitei em delírio.
Como não… Quão
melindrosa é a razão. Sombras numa parede qualquer,
vestimenta de
mulher. Exuberante saber, simples sentir…
Porque a simplicidade
é gomo de tangerina saboreada com fervor,
é mel por
entre os dedos, escorre vertiginosamente pela mente.
Eleva assim
ao monte mais alto o amor!
E o medo… ai
o medo de arriscar a ser feliz, atira contigo ao chão.
-Como não?
Perguntam as
vozes que te assombram no sono. E tu dormes,
aconchegado nas
certezas, e as incertezas pairam no escuro.
Não te
atrevas a respirar, a chamar, a sentir, o cheiro de Abril.
Não vá a
sombra que espreita pela fechadura, acordar os mortos.
E nesse dia
a Primavera chegará aos campos… Como não.
Penso comigo
enquanto no meu receio os teus medos dançam em castigo.
E o amor definha sem abrigo!
Procura… Prosa Poética
Tempos houve
em que o ser tremia, ignóbil sensação de perca,
descabelada rebolava
sobre mim mesma, ânsia incontrolável num labirinto.
Onde todos
os sentidos mergulhavam no irrequieto que é ´´ não controlar``
as tuas
ambições…
Tempos houve
em que à tardinha, sentada na soleira da porta,
onde o
alpendre assemelha regaço, chorava… a ausência!
Em momentos propícios
ao receio de perder.
Hoje, às
portas de um outono pardusco vejo o quanto errei.
Não se
cativa melancolia que não nos pertença!
Muito menos
é utopia a dor em espasmos.
E agora
talvez interrogues as gotas de chuva, que trazem à terra vida nova.
Que é feito
de mim, que é feito da tábua rasa onde pernoitastes…
Dir-te-á a
morrinha outonal - Procura por ela nas esquinas, nos montes e nos pensamentos.
Procura mas não
te percas, na perca do que nunca aconteceu-...
Foto de Alfredo Cunha.
Perco-me de ti... Prosa Poética.
Perco-me de
ti aos poucos, as recordações retidas nos socalcos da memória,
começam a
ter a cor do bronze.
E os dias
outrora tingidos pela condolência, escorregam agora nas teias da nostalgia.
Matreira vai
e vêm como as marés.
Perco a tua
imagem, o teu clamor… Dissipa-se a vida vivida na corda bamba.
Pergunto então
ao vento que visita amiúde a minha vertigem…
- Será
a recordação, marasmo?
Será
certamente água a correr p`ro mar! Teias de aranha que envolvem como véu…
Ou então…
será o ar que leva ao coração uma nesga de sonho!
Perco-me de
ti aos poucos e na demanda acabarei por perder parte de mim,
aí mendigarei
por nenhures, levarei encrostada na alma a ternura,
e quando
dormir finalmente no aconchego do barro, escreverei com o branco da cal.
Só assim a memória valeu a pena.
segunda-feira, 3 de novembro de 2014
domingo, 2 de novembro de 2014
Repouso...
Rebolam as
pedras pela ladeira,
Depois da
canseira ao subir!
Rebolam as
dores, os risos
Os partos adiados.
Até a vida,
rebola.
Rebolam os
sonhos
Em dias
seguintes,
Ironia em
matizes
Que adornam
os dias…
Vejam bem!
Tudo rebola
depois da subida.
E a sorte
repousa na cova mais funda,
Onde a terra
se atreve a dormir.
Não reboles
tu no tempo que é teu.
E assim
desperdices pouco mais que nada,
Pequena
fortuna que ao nascer herdaste…
Não rebolem
aparências perdidas no ego,
Nem aflição
no coração escondida.
Assomo
fantasmagórico que impões
Ao mundo em
redor.
E assim no
buraco mais fundo,
Onde a terra
repousa,
Encontres
paz e a saudade p`ra trás,
Faça de ti
deus… Sem pés de barro.
sábado, 1 de novembro de 2014
Corro...
Falta a
outra metade.
A que está
colada na alma
E se
transfigura em partículas,
Tão finas,
tão finas,
Que circulam
no ser…
Falta um
tempo
Na ausência
de mim.
O sorrir que
tanto me larga,
Até o chorar
me falta
Num espaço
sem fim…
No entanto
corro
Atrás do
vento!
No entanto
grito
Na alvorada!
É que a
esperança dobrada
Em dias
estivais,
Traz ao meu âmago
o crer
Num amanhã
de paz.
sexta-feira, 31 de outubro de 2014
quinta-feira, 30 de outubro de 2014
Poesia...
´´A poesia é
rima clara``
Perguntou ninguém
a outro.
Riu na sua cara
E respondeu contrafeito.
Poesia é
água na fonte,
Melodia ao
nascer do dia.
Gesto de
amor carinhoso
Raiva e
magia.
Sobretudo
inquietante,
Expectante
ou distante.
Poesia é ser
queixoso.
Levar nesse
queixume
Pétalas de
amor-perfeito.
Imperfeição
nas palavras
Pode ser. Ou
então…
Então, sangue
que desliza no colo
De uma
mulher em parto.
Deve ser
calos nas mãos,
Suor de um
camponês,
Um pobre que
pede esmola.
Um bebé a
chorar!
Poesia deve
encantar
E sobretudo
ficar.
Na retina
além tempo.
Poesia
também é rima
Mas muito
mais que isso
É mutação em
palavras
Que deslizam
em safras
Corredias.
Ninguém
olhou o outro,
Não sabia do
que falara.
P`ra ele
poesia era
Rimar e
pronto…
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