quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Cante...

Na tua dolência estival, pedaço de chão maior,
Corres na cauda do vento numa esperança soalheira.
E num azul acordar, um hino em ré menor,
Deslizas numa samarra, numa lua aventureira.

Esculpido na terra virgem Alentejo é o louvor
Dos que transportam no sangue o verde de uma azinheira,
E a paz dos descampados se assemelha a trovador,
Com seu cante nos embala em voz fresca a cantadeira.

Que canta mano a mano com homens de tez morena,
Passos lentos vão pisando as pedras nuas da rua.
Em voz grave todos cantam modinhas ao por do sol,
No peito bordada a oiro brilha a Pátria, seu farol.




quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Se o poema não sangrar...

No dia em que o filho da P…ta não sangrar
Deixarei em paz os empedernidos.
Nesse dia, fecharei em cova rasa a poesia
E dançarei na praça ao som da liberdade.
A minha, muito minha Liberdade.

Partirei ao meio o lápis par a par
E os cadernos bolorentos
Em todas as rimas sem maresia.
Passarei a viver da vaidade
Acumulada na verdade.
Muito minha…

Nesse dia as filhas sem pai
Deixarão de se prostituir
Junto das filhas amadas.
E os bons rapazes serão varões
Gerados nos colchões
Sem povo.

Serei então comida pelos bichos
Também em cova rasa mas fecunda
Que terá na lápide desenhada a giz.

Morreu a insanidade do poema embrutecido.





Às vezes...

Às vezes acho todas as palavras desnutridas
Todas as pretensas obras de arte iludidas
Despidas de sentimentos.

Às vezes acho os poetas tão chatos
E as crianças tão traquinas
As pedras da rua, penso…
Serão ´´astros`` tombados com falta de ar
E os versos ou as frases, falta de mar
Em terra sem destino.

Às vezes acho que sou abissal
Com um olhar informal.
Outras que sou o diabo à solta.
Às vezes não tenho paciência…
Nem para ler, queria morrer
Ao empanturrar-me de letras.

Depois digo de mim para mim.
Desliga o botão… logo ali tropeço
Em versos e reversos sem miolo.

Às vezes acho os poetas tão chatos!
E coloco o pé bem no cimo do bolo.
Dou por mim engolindo a cereja
Tal criança sem limites.







Assombro...

Caiu na rua o assombro, preso nas folhas de Outono!
Houve gente abismada, um sururu, intragável.
E nas pedras da calçada até ruiu o bordel…
Saiu à rua o assombro. O Rei caiu do trono!

Pergunto neste dia, em que às vezes tenho sono.
Serão os cães ventania, as palavras carrossel,
serão os homens, feras famintas a granel…
Ou então; chegou o fim dos tempos. Mono...!

Ou macacada ilusória num reino de meio sem ponta…
Jaz estendida na montra de uma qualquer baiuca!
E depois adivinho-me barata tonta.

Nada será igual! Tudo nasce e desponta.
Mas... mais dia, menos dia, logo cai a peruca.
Resta acreditar que o amanhã é que conta.



quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Amor...

Não cantes Pátria inglória
Berço de poetas tresloucados
Esquece na valeta a tua história
Da bandeira esfiapa os brocados.

Não cantes em voz dolente
Amor, ou a cor dos sentidos.
Renegas num fado miserável
O povo e seus gemidos!
Não cantes Ave-marias…
Quando todas as Marias
São Marias em desgraça.
E os Maneis…
Carcaças que mendigam na praça.

Não cantes, não te atrevas…
Repara no muro dos lamentos
Ou então…
Nos rostos quando cantas,
AMOR, AMOR, AMOR!
Engolido nas gargantas
Dos que tem fome.

Foto: Alfredo Cunha



terça-feira, 11 de novembro de 2014

Amei...

Amei por entre as flores da primavera,
Sem espaço p`ra chorar a desventura!
Pois quem ama exalta ou desespera,
Igual à sorte que perdura na candura.

De um beijo ao luar. O jus de uma quimera,
É quase sempre a ponta de ternura.
Que nos empurra ou degenera,
Em noite clara envolta na loucura!

De dois corpos cansados no viver…
Ou então, caminhos a par, insurreição.
Será o amor uma leitura a aprender.

Ou será simplesmente certeza e o prazer,
Que na morte nos embala, a perfeição…
De que amar é vida além sorte a acontecer!




quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Se nada vês…

Partindo do princípio que nada sabes.
Então o porquê que assola,
O meu coração quando abres
A porta ao sentir na esmola.
Minutos inacabados que deixaste
Atrás.

Se nada sabes ou sentes.
Porque gritam os teus olhos
Contigo a sós!
Porque moem os meus sentires
Igual a Mós.

Talvez porque a terra é redonda
E o tempo atrás exista,
Numa era recôndita.
Esta vida seja uma partida.

Partindo do princípio que nada vês
Além do dia-a-dia sem sal.
Então porque choras e não crês

Num destino ancestral…

Ao Ler...

Existem coisas que não entendo, recuso entendimento.
Palavras truncadas, acções exaltadas em passos trancados.
Que saber…
Para que serve a amputação do verbo, se tudo é simples,
em letra ligeira.
Ou então floreados descabidos do cerne…
Existem coisas que não entendo, nem me esforço,
guardo o alcance para o que vem a seguir.
Vaidade minha, esta falta de entendimento,
Cuido dela ao dormir ao relento, por entre as gentes!
Numa terra sombria a raiar de sol!
Embrenhada na sombra que as ovelhas procuram…
Ai… tão estranha forma de ser em formato gasto p`lo sal,
que as memorias brotam sem vergonha! E depois não entendo…

Recuso entender arabescos floreados no ler.

terça-feira, 4 de novembro de 2014

Simples… Prosa Poética.

Simplicidade, essa palavra singela que desliza enrolada nos dias,
sobrevoados por sonhos, onde os receios dormem.
É tudo tão simples e tão complicado!
A minha e a tua mente paredes meias no ser, afastadas nas firmezas.
Deslizo segura na minha insegurança, deslizas tu inseguro na inseguridade…
Tua companheira de horas mortas, tão torta mas tão segura.
Deslizo sem medo pelo sentir que assumo. Deslizas com medo de perder.
Tão simples quanto isso. Simples como só os simples conseguem ver.
Perguntam certezas ancestrais. – Será simplicidade arrogância?
Respondem inseguros e marginais os sentidos.
 - Sobranceira é a certeza, simples morte dos sonhos.
Então do que falo afinal se nem eu entendo, entenderás porventura…
O amanhã que espera frio e cauteloso, porque agora com naturalidade,
o amor fica guardado no baú das proezas.
É tudo tão simples e tão complicado, como se dois e dois não fossem vinte e dois.
Como se morrer e viver não fosse tudo igual.
A morte de um sonho pode ser a vida de um novo despontar!
Simplicidade palavra fácil mas que invertes quando omites o ser.
Simplicidade na arrogância com que vasculho o teu querer.
E então, então… estarão de mãos dadas a singeleza e a soberba,
com que nós dois vivemos de costas voltadas.



  

Sombras… Prosa Poética.

 Como não… penso comigo enquanto procuro explicação para os medos,
para o teu olhar aguado, onde pernoitei em delírio.
Como não… Quão melindrosa é a razão. Sombras numa parede qualquer,
vestimenta de mulher. Exuberante saber, simples sentir…
Porque a simplicidade é gomo de tangerina saboreada com fervor,
é mel por entre os dedos, escorre vertiginosamente pela mente.
Eleva assim ao monte mais alto o amor!
E o medo… ai o medo de arriscar a ser feliz, atira contigo ao chão.
  -Como não?
Perguntam as vozes que te assombram no sono. E tu dormes,
aconchegado nas certezas, e as incertezas pairam no escuro.
Não te atrevas a respirar, a chamar, a sentir, o cheiro de Abril.
Não vá a sombra que espreita pela fechadura, acordar os mortos.
E nesse dia a Primavera chegará aos campos… Como não.
Penso comigo enquanto no meu receio os teus medos dançam em castigo.
 E o amor definha sem abrigo!


Procura… Prosa Poética

Tempos houve em que o ser tremia, ignóbil sensação de perca,
descabelada rebolava sobre mim mesma, ânsia incontrolável num labirinto.
Onde todos os sentidos mergulhavam no irrequieto que é ´´ não controlar``
as tuas ambições…
Tempos houve em que à tardinha, sentada na soleira da porta,
onde o alpendre assemelha regaço, chorava… a ausência!
Em momentos propícios ao receio de perder.
Hoje, às portas de um outono pardusco vejo o quanto errei.
Não se cativa melancolia que não nos pertença!
Muito menos é utopia a dor em espasmos.
E agora talvez interrogues as gotas de chuva, que trazem à terra vida nova.
Que é feito de mim, que é feito da tábua rasa onde pernoitastes…
Dir-te-á a morrinha outonal - Procura por ela nas esquinas, nos montes e nos pensamentos.
Procura mas não te percas, na perca do que nunca aconteceu-...

Foto de Alfredo Cunha.



  

Perco-me de ti... Prosa Poética.

Perco-me de ti aos poucos, as recordações retidas nos socalcos da memória,
começam a ter a cor do bronze.
E os dias outrora tingidos pela condolência, escorregam agora nas teias da nostalgia.
Matreira vai e vêm como as marés.
Perco a tua imagem, o teu clamor… Dissipa-se a vida vivida na corda bamba.
Pergunto então ao vento que visita amiúde a minha vertigem…
   - Será a recordação, marasmo?
Será certamente água a correr p`ro mar! Teias de aranha que envolvem como véu…
Ou então… será o ar que leva ao coração uma nesga de sonho!
Perco-me de ti aos poucos e na demanda acabarei por perder parte de mim,
aí mendigarei por nenhures, levarei encrostada na alma a ternura,
e quando dormir finalmente no aconchego do barro, escreverei com o branco da cal.

Só assim a memória valeu a pena.

domingo, 2 de novembro de 2014

Repouso...

Rebolam as pedras pela ladeira,
Depois da canseira ao subir!
Rebolam as dores, os risos
Os partos adiados.
Até a vida, rebola.

Rebolam os sonhos
Em dias seguintes,
Ironia em matizes
Que adornam os dias…
Vejam bem!
Tudo rebola depois da subida.
E a sorte repousa na cova mais funda,
Onde a terra se atreve a dormir.

Não reboles tu no tempo que é teu.
E assim desperdices pouco mais que nada,
Pequena fortuna que ao nascer herdaste…
Não rebolem aparências perdidas no ego,
Nem aflição no coração escondida.
Assomo fantasmagórico que impões
Ao mundo em redor.

E assim no buraco mais fundo,
Onde a terra repousa,
Encontres paz e a saudade p`ra trás,
Faça de ti deus… Sem pés de barro.




Estranha Paixão no Youtube


sábado, 1 de novembro de 2014

Corro...

Falta a outra metade.
A que está colada na alma
E se transfigura em partículas,
Tão finas, tão finas,
Que circulam no ser…

Falta um tempo
Na ausência de mim.
O sorrir que tanto me larga,
Até o chorar me falta
Num espaço sem fim…

No entanto corro
Atrás do vento!
No entanto grito
Na alvorada!
É que a esperança dobrada
Em dias estivais,
Traz ao meu âmago o crer

Num amanhã de paz.

Palavras ao Vento Suão, Antónia Ruivo