domingo, 31 de julho de 2016

Paradigma...

 Medito sobre as curvas do ser,
do estar ou do fazer, automatizo
o pensamento, e logo direcciono
a atenção ao conciso. Que fazer?

Quando todas as palavras são parecer.
Presença ambígua, num tempo vazio.
Dolorosa sensação de uso sem fuso.
Daquilo que acham que deve acontecer.

Não nego. Não serei a airosa e bela…
Nem tampouco a razão mais singela.
Não serei ínfima, ou confusão por si só.

Mas sou um caso prensado ao pó.
Em nenhures perdido sem impor dó.
Sou, um inesperado paradigma!



Xadrez...

Devias saber se ondulas altivez,
ou subterfúgio em tela luminosa.
 O teatro montado em redor do talvez,
é desmontado numa vénia, airosa.

Se o saber quase sempre é robustez,
e se a vida até pode ser gloriosa.
Porque te perdes num jogo de xadrez?
Só porque ela se mostra caprichosa…

Deixa correr o rio, desagua no mar.
Na força das águas, salpicos de sal.
No seu corre, corre; uma voz a cantar.

Porque temes? Será o sonho irreal?
Deixa que corra… Não temas olhar…
As areias na foz… Se até a espuma é real!

Décima. Alentejo

Mote

Alentejo campo aberto.
O pão nosso de cada dia.
Apesar do tempo incerto.
Tens no sangue a valentia!
  
 O dia vai de vencida,
de Janeiro a Dezembro.
Pelo meio vem Setembro,
em rodopio com a vida.
 Junho é o auge da lida,
e traz Agosto o lamento…
Das cantigas sem tempo,
talhadas p’lo sol ardente,
onde o suão está presente.
Alentejo, campo aberto!

Da minha meninice,
de algumas dores e sorrisos,
que em momentos precisos,
foram dos homens crendice.
Embora no tempo ruísse:
O lamento da ceara.
O barro mantém a cara,
vincado no campo ao sol pôr.
Onde o ocaso é a cor,
o pão nosso de cada dia!

Talhado p’los calos da mão
e por lágrimas fugidias.
Por cantigas, alegrias,
espalhadas de mão em mão,
ombro a ombro, um irmão.
Até a voz é lamento,
numa cantiga o intento,
de preservar a memória,
a derrota a vitória.
Apesar do tempo incerto.

Até na esperança de um capote.
De finas contas forjado.
A Cor da lembrança é o fado,
de um mouro além monte.
 Um rebanho no horizonte,
é imagem que alumia.
Safões e samarra que um dia
no espaço fizeram história.
Alentejo, trajectória…
Tens no sangue a valentia!

A mim mesma...

Legitimo sim; a minha pequenez.
Ou os meus sonhos altivos em cimeira.
Os passos dados, um de cada vez.
Os acertos e uma boa dose de asneira.

Sou estranho baluarte sem robustez!
Até transporto aos ombros a cegueira!
Sinto-me barata tonta; talvez,
seja o cerne que incita a fronteira.

Entre o que vejo e o que penso.
O que sei ou não sei… mais não digo…
Logo; desdigo apressada o senso!

Se até mesmo o sol justifica o abrigo.
Não quer dizer que não esteja suspenso,
o mundo. Assim; afirmo e contradigo!


Jamais perco tempo com tolos...

Eu, poeta me intitulo.
De um país de chão cavado.
Em Camões bebi o brado.
Em Pessoa o pensamento.
Em Bocage a ironia.
Em Florbela a ousadia!
Do povo me amamentei.
E na décima faço lei!
Já no soneto divago…
Bebo as estrofes num trago,
num poema de expressão livre!
Afirmo que sempre tive:
_Uma vaidade singela.
Seja qual for a tabela,
os meus versos são janela,
na qual me abeiro sem medo.
Este é o meu segredo.
Poeta de reles sina.
Sou assim desde menina!
Nascida no Alentejo.
Talvez: por isso almejo…
Levar de mão em mão,
a visão ao coração.
Na elite ou rudeza,
está na minha natureza,
qualquer estilo, qualquer rima!
De todos fiz minha sina.
E da sina ninguém foge.
Nasça rico ou indigente.
Quem tem a correr nas veias:
_Searas verdes, marés cheias,
ou dores de alma vazia,
até mesmo uma razia;
num país que esquece o sonho.
Por vezes é tão tristonho,
ser poeta e ir além…
Onde não se atreve ninguém…
Por isso mesmo; componho:
_Versos de qualquer maneira!
Vibro ao arriar na cegueira;
que o estigma se atreve a erguer.

Jamais perco tempo com tolos, escrevo p`ra meu prazer.


domingo, 24 de julho de 2016

Responde…

Eu sei, o medo impera na morrinha dos dias.
Lá onde os silêncios são grilhões em caravela,
e as esquinas são as quinas de bandeiras frias.
Razões e certezas; inútil debuxo em fria tela!

Eu sei. o estranho lapso ofusca salas vazias.
Tudo se perde no tempo ínfimo tal sentinela;
adormecida na poeira de estrondosas razias:
Em que tudo o que resta; é sombra na cidadela!

Responde: - qual o segredo que mantém átona
a ilusão? Será por ventura ficção desfigurada,
um corpo na praia? Ou será inútil maratona?

Fingir que o pensamento ignora a estrada,
achando não ser. Responde: - Se é um dom a vida:
porque se teima na fuinha razão, insana?


sexta-feira, 15 de julho de 2016

Deixa às rosas os seus espinhos…

Chovem rosas brancas numa praia iluminada.
Os olhos choram, mas a alma não se reconhece;
na imensidão das águas.
Aos pés da terra as rosas choram!
Afinal… a penumbra existe, numa praia iluminada!

Pensa comigo.
Para quê desfolhar as rosas se são ínfimas.
No areal que é a mente.
Deixa às rosas os seus espinhos,
se o amor se desvanece em espuma.
Deixa às rosas os seus espinhos e ao olhar
a alma em movimento.
E talvez um dia na imensidão das águas:
Se esgote o lamento.




quinta-feira, 14 de julho de 2016

Ninguém parece ver

Existem dias em que me dispo de artefactos…
Quando os silêncios se transformam em masmorras.
Tudo me abandona e o tanto que tinha a dizer;
transforma-se em pó num mar sem praia.

Será que o meu rosto se assemelha ao sofrer?
Ou são os temores mortíferas adagas?
Existem dias que visto eternos lamentos!
Não são meus… Tem nos olhos a lida
numa labuta desenfreada pelo ser.

Ou mais curta… ou mais comprida…
E eu que tinha tanto a dizer:
_Dispo-me dos trajes coloridos
mas ninguém parece ver.


segunda-feira, 4 de julho de 2016

Ao encontro do sol...

Saí para a rua e cumprimentei as calçadas.
Namorei com elas, segredei-lhes os meus, nadas.
 Rodopiei no vento e no sol e chegou o ocaso…
Esperei por ti… desisti… que estranho caso.
É esta saudade sem rosto… dolente!

Quando dei por mim a noite caía,
e o meu coração… de frio tremia.
Abri os braços no meio da rua;
as estrelas sorriram…. estava nua!

Alta madrugada regressei a casa.
Somente a rua vazia…
Adormeci… sonhei que ria;
no regaço do sonho abri as asas…
Ao encontro do sol e de um novo dia.


domingo, 3 de julho de 2016

Consente...

Deixa que a tarde deslize no silêncio da alma…
Que os telhados murmurem ao ouvido do céu:
_Um olhar muito nosso.

Escuta:
_E se embrulhássemos as palavras em sonhos…
Espalhados p`lo restolho beijado p`lo sol.
Consente, que interrogue o teu sentir…
E que o provir seja o inicio da vida,
num terreiro onde as palavras se despem:
_De artefactos.

Olha o horizonte… onde o céu beija o mar.
E a terra; as estrelas numa noite de luar.
Deixa que descubra pirilampos nos teus olhos…
E nos campos fartos molhos;
em eiras sem tempo.

Atravessa ao meu lado; este chão…
Alentejo… Campo aberto no coração.
Recordação de mãos dadas,
ao sabor da madrugada.
Só o luar de Agosto se atreve a revelar:
_Este sentir que é nosso!

Consente que a tarde deslize… mansamente.
E que o mundo um dia grite:
-Foram terra… barro… trigo e alma!
Desenharam lentamente na areia,
espalhada aos sete ventos…
Todos os sonhos sem voz.


Palavras ao Vento Suão, Antónia Ruivo