terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Gritei


Caíram-me aos pés em contas lilases
Os meus pensamentos, os mais fugazes
Rolaram no chão despidos de nada
Deixaram no tempo luz esfrangalhada

Quando dei por mim amanheceu
Olhei o dia que não me reconheceu
Nem os pardais de telhado o gato vadio
Ao olharem para mim só viram vazio

O que restou de uma noite igual
A milhentas noites, escuro infernal
Só os meus pensamentos deram por mim
De manhã olhei, gritei, repara por fim.

O circo

Nas noites de insónia sonhava contigo
Nesta noite de insónia sonho com o nada
O nada transportado numa cara fechada
Num capuz enfiado, num momento forçado

Nesta noite de insónia sonho com a mentira
Com  a falta de brio e muito mais
Sonho com a imodéstia a manipulação
A confusão e a frustração
Sonho com duas caras igual a feijão
Nesta noite de insónia fugiram os ais

Chegou junto a mim
O frio da morte na estrada da sorte
Chegou finalmente a tua cara lavada
Caiu a fachada, desvendou-se a estrada
Chegou junto a mim a memória vadia
Noite corredia, em passo sumido
Chegou o gemido da minha alma inquieta
Mas chegou também uma paz imperfeita

Afinal nem todo o circo precisa de palhaço
Afinal na lágrima que corre e no chão logo dorme
Repete-se o sorriso

O circo fechou neste instante preciso.

sábado, 28 de janeiro de 2012

Porquê

Nas vezes que o vento abre fendas
Imagino que me vês
Mas o silêncio imperfeito tira as vendas
Restam quase sempre os porquês

Porquê
O olhar não trás nada de novo
O riso intrincado no canto da boca
Disputa com o olhar magoado
Confusa assim adormeço
Enquanto o vento fustiga
De manhã mal me reconheço
Lavo a cara, finjo a vida
O porquê acomodo
Comodamente num canto da mente
Assim passam os meses
Os dias e os anos
Assim meu amor fingimos
Que alcançamos.

Júlia Soares ( um pseudónimo para falar de amor)

O peixe vermelho

O meu peixe vermelho
Olha para mim
Mas não me vê
Velando o seu degredo
Penso entender
O porquê
Do meu peixe vermelho
Olhar e mesmo assim
Sentir por mim
Um misto de água gelada
Açucarada
Enfim
Ao mesmo tempo salgada

O fundo do aquário
Está uma barafunda
Por isso o meu peixe
Olha
Mas a  ´´cega´´
Afinal sou eu
Na entrega
Despida de imaginário
O meu peixe vermelho
anoiteceu.
Resta-me o escuro
Como breu




terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Mordaças

Suspenso no supérfluo
Está o sentimento de posse
Quero e mando
De que vale a simbiose
Perde caducidade
Na ténue luz da aurora
Não se comanda liberdade
A alma voa desperta

Para que te servem as vendas
Quando a sorte é soberana
De que servem as mordaças
De que serve a vida insana.




segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Zumbi

Que merda de vida a que inventei
Que caminhos tortuosos palmilhei
Os voos que forjei e não voei
Que futuro a desbravar enterrei

Ano após ano em que tombo
Num vazio gelado sem Inverno
Tenho por companhia o inferno
Da saudade por viver com estrondo

Cegueira

Parede intransponível
Uma folha morta amarelecida
Lagoa sem cascata
Uma garça ferida
Aquilo que não se vê
O sol que se esconde no poente
Metade da outra metade
Somente eu
Uma barreira inerte

Serei tudo ao teu olhar
Aquilo que mais te convêm
Metade por desbravar
A outra deslizando além

Do imaginável confortável
Impermeável e intransponível
Sobe a capa inquebrável
Da tua cegueira insensível.


sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Portugal

As asas do vento transportam a melancolia
Das gotas de orvalho de um Inverno distante
Transportam os passos de um cavaleiro andante
O grito taciturno que no tempo jazia

Chegou de rompante numa manhã gritante
Choraram as almas e as barrigas vazias
Até as crianças choraram com fome, frívolas
São hoje as certezas de uma terra errante

Meu Portugal que se passa contigo
Que se passa afinal na mente de um povo
Fechou uma janela não abriu um postigo

Ai meu país triste sina a tua, nada de novo
Te encontro nesta era tudo é idêntico
A tempos remotos, barriga vazia e sapato roto




terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Incerto

Há um deserto que prolifera ao andar
A areia branca onde a transparência se acomoda
E os cactos espinhosos tentam em vão ocultar
Os insectos que voam livremente e a hora marcada

Pelo anoitecer tranquilo que anuncia um rio
De água livremente sepultada ou escondida
De um medo inteligente mas nada arredio
Sob as areias escaldantes e corredias da vida

Aprende a temer o incerto e as arrogâncias
Não subestimes vontades, muito menos vaidades
Ambas são motores loucos ou sãos, são miragens

Que a estrada transporta nunca se sabe quem é
O mendigo andrajoso palmilhando o deserto
Pode estar disfarçado, rei ou pedinte o incerto.




quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Palavras


Não me fales
Não te percas mais comigo
Não me fales ao ouvido
Que me amas

Deitar palavras ao vento
Serão apenas lamento
Ás vezes penso que sim
Falamos, e descompensamos
Os pensamentos fortuitos
Não, palavras serão sempre mais
Ás vezes soam a ais
Aos sentidos de quem ouve
Por mais que o tempo ouse
Apagar a sensação
Palavras de mão em mão

São setas voando alto

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Inverno gelado

Acabei de acordar e olhei ao longe o azul
Do céu que acorda também, o sol sorridente
Penetrou minha alma um bom dia diferente
Foi a emoção sentida, a luz cristalina ao sul

Aqueceu este coração moído e o presente
Acabou por ganhar sentido, borboletas
Alaram o Inverno gelado, imaginei cometas
Esvoaçando por todo o lado, diferente

Esta manhã, sei que estás aí mesmo não te vendo
Sei que o dia sorrirá e o amanhã quem sabe
Trará na geada o teu olhar, o Inverno acabe

Por fim chegue a Primavera com ela a esperança
Uma andorinha regresse traga bonança
Acabei de acordar um bom dia te digo sorrindo.


Diz-me noite

O dia fortuito perguntou à noite de improviso
O que é afinal o aviso do vento que geme
Ao longe por entre a serra que desnuda treme
O que é afinal um dia frio sem instante preciso

Porque correm os rios extasiados  pró mar
Os teus olhos porque me olham ternamente
Sempre que do peito se solta num repente
Um suspiro indolente que teimas em calar

Se as andorinhas acabam sempre por voltar
Diz-me afinal porque sempre vão embora
Igual a um passo apressado estrada fora

Diz-me noite quem sabe entenderei
Porque o sol no firmamento é senhor e rei
Porque é tão breve e leve o nosso encontrar 

Centelha


Passas por mim e não me vês indago
Ao vento norte porque passas sem me olhar
Indago ás pedras da rua porque ao passar
O vento passa correndo frente ao largo

Ao largo da longa planície onde vagueia
Uma saudade desnuda que soluça no vento
Recolhe pedaços de terra solta um lamento
Ergue tão alta centelha sem saber semeia

Pedaços de mim do meu sentir em campo aberto
E tu que passas por mim sem me ver ou ter
Que soltarás afinal no meu modesto viver

Será que um dia se tocam por fim as mãos
Será meu amor o dia sem fim o presságio 
Da sorte que separa o que na vida é fortuito

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

No teu peito

Terna é a vida um elevo em recompensas
Sempre que me abeiro do teu meigo olhar
Imagino o nascer do sol brilhantes imensas
São as estrelas sob os teus cabelos a flutuar

Fios de neve de uma brancura tal açucenas
Que enchem de cor e vida a alma em pedaços
A minha que naufraga em águas serenas
Se ternamente me amparas em teus braços

Carregas sob os ombros subtil impaciência
Das manhãs claras em Agosto a efervescência
É um misto de saudade e vitória sem desgosto

Que deus me dê sempre o acolhimento
De um abraço apertado no teu peito
Igual á calmaria de um ribeiro no seu leito

domingo, 8 de janeiro de 2012

Momento

Falta-me uma nesga de luz
Sei que assim é pelo silêncio
Nem quase sempre traduz
Esquecimento, mas o inquieto vazio
Deixa-me sinuosamente alerta
Curioso o silêncio que desperta
O vazio da saudade

Quem sabe é a tua voz
Ou o teu pensamento
Será talvez albatroz
Que voa um momento

Tão ternurento e feliz
É assim, eu te revivo
Com esse ar de petiz
Quando me olhas eu vivo

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Será que o tempo

Abrimos mão do universo
Confinamos num labirinto escuro e bafiento
Esquecemos tanta vez que no virar da esquina
Está a meta mesmo que seja pequenina
Ao cruzá-la uma clareira de afectos
Verdes, gigantes numa floresta a desbravar
Esquecemos que podemos caminhar
Acomodamos os sentidos segundo opiniões
Assim levamos a vida aos encontrões

Finda por fim, metade ficou por fazer
Por dizer, a outra metade foi tempo de esquecer
Finda por fim, nesse instante será que o tempo
Dará tempo de ter pena enfim

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Estiveste

Numa dança sem ter fim se passa dançando
Alongam-se os braços, alcançando
O futuro que corre no verso
De um tempo a advir ás vezes controverso
Numa dança sem ter fim sonhamos

Perdemos minutos, ganhamos segundos
Procuramos amigos nos inimigos
Amamos, odiamos o verso da medalha
Vivemos ganhando uma ou outra batalha
E perdemos tanto no tanto que perdemos

Esgueira-se pelos dedos uma nesga de céu
Ás vezes a mente está coberta pelo véu
De uma cegueira imaginável
Outras vezes acontece o amor, é palpável
Mas o medo de errar trava a fome de amar

Ou o medo de amar sacia a fome de errar
Numa dança sem ter fim levamos ás costas
Pedaços que abandonamos pelas encostas
Se ao olhar para trás vislumbrar um jardim
Posso morrer descansada estiveste junto a mim.

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

O amor

O amor, o que é o amor aos olhos do dia
É folhagem fresca e leve maresia
Ou um ninho de penas, noites serenas
O que é o amor aos olhos da vida
É uma estrada sem curvas, comprida
O aconchego das tardes amenas

O amor é o eixo que tudo dirige
Uma certeza que se ergue em esfinge
O amor é o céu de asas libertas
O amor és tu quando te acercas

De passo incerto coração no olhar
Um misto de esperança num acreditar
O amor é o dia num despertar
Uma espera sem pressas num seguro olhar.

Eterno

Que o cansaço que me assola
Se esvaia com o vento em voos de mil asas
Que me olhes como sou mesmo se desfeita a alma
O vento que leve além as mágoas
Não te percas com a volta nem com a revolta
O tempo é exímio e contundente
É o parceiro perfeito para moldar o presente
Por tudo isso de que vale um passo atrás
Se na esquina da vida tudo se desfaz

Só o pó é eterno contra isso nada sou capaz
A passagem é fortuita está rota a sacola
Por mais que me esgueire que seja audaz
O tempo é que decide se prolonga a esmola.  

domingo, 1 de janeiro de 2012

Um novo olhar

Nada tenho para dizer que noite esta
O cansaço tolhe-me as ideias
Mas escrevo ás telhas do telhado
Imagino que elas são colmeias
E que a vida é húmida floresta
Assim lhes escrevo um verso inacabado

Junto ás rimas o calor e o acto de amar
Salpico-as com uma esperança arredia
Canto baixinho um refrão
Desejo que ao despertar o novo dia
Desperte também em mim um novo olhar
Brote com o sol a confiança em combustão

Palavras ao Vento Suão, Antónia Ruivo