sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Teorema


No outro dia saí pé ( antes) pé
De mim mesma
Eu explico a contenda
Caminhei pela beira de ti
Tropecei no beiral de mim
Assim
Pois é

O teu cheiro na almofada
Deixou-me transtornada
Afinal…
De que lado da cama dormi
Ai de mim!
Deslizei para o outro lado
Tudo trocado
O teu cheiro
Tão vincado
Saltei da cama num ápice
Em cima da mesa
Num (cálice)
O teu cheiro, ali

Regressei para a cama
Adormeci…
Nisto acordei
E por fim desnudo
O teu pijama
ali
Afinal (teorema)
Sim, sim
Teu sorriso
 O meu mundo é assim.

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Desapego

Ouvi perderem-se os passos na calçada
As pedras recolheram-se no sossego
A lua escondeu-se bela mas envergonhada
A minha alma empalideceu sem aconchego

Na noite extraviou um grito e a alvorada
Aproximou-se pedindo perdão cego
Nasceu o sol nesse dia naquela estrada
Sumiram-se as pedras da calçada em desapego

Viras as costas, enorme o peso dos teus ombros
Quando caminhas com passos incertos
Serei eu a enganada ou serei para sempre amada

Ou serão as pedras da calçada agastada
Pelas findas e vindas numa estrada imaginada
Que te trás até mim por breves momentos.

Júlia Soares (pseudónimo)

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Medo

Há-de ser o medo o maior empecilho!
Arco circundante que limita horizontes.
Numa insolvência por vezes subtil,
agoirenta, luxuosa(mente) senil.
É patriarca de certas ganâncias!
A vida escorre leitosa pelos riachos entupidos...
Numa perversidade insidiosa, encaminha
os sentidos, bifurcados fogosamente na ganância.
E os homens esperam...

Enquanto outros homens maquiavélica (mente) apontam...
O medo... não vás por aí... não é seguro...
 Não vás por aí... olha a barreira...
Repara: além abre-se a fronteira...
A torneira; pinga-pinga!

Há-de ser o medo a pedra bacilar que impede (...) Autonomia!



Não sei


Não sei
Nada percebo de saudade desnecessária
Ingrata inquietação que me assola
Os abutres circundam a viela
O barulho das asas transporta saudade

De voos inacabados
Interrompidos pelas certezas
O barulho das asas traz incertezas

Se tivesse virado naquela esquina
Se tivesse saltado aquele muro
Deslizado pela sombra
Se o sol não tivesse sido a meta

Teria amealhado esta saudade escusada
Que me conduz a algures
Um sitio remoto na imaginação
Onde adivinho o toque suave da mão
Que me conduz pela razão contrária.

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Mulher

Uma pétala de cor brilhante
A iluminar o olhar
Um traço fino na boca
O sorriso a mostrar
Um coração amigo
Uma mão sempre estendida

Num sorriso de mulher
Se encontra a ternura
A beleza a formosura
Um rumo, uma medida
Num sorriso de mulher
Que não se dá por vencida.


domingo, 25 de setembro de 2011

Recatos


Despe os preconceitos até os pudores
Razão de negar a clareza que os gestos nomeiam
Nos olhares aguados as emoções esperneiam
Em gestos requintados denunciam-se actores

São sempre os lábios que dizem não, impostores
Quanto é péssimo o papel que representam
Se os olhos pesquisam e sempre contestam
Cada negação enfraquecida pelas dores

Que transparecem no branco da retina
Ao virar da esquina no vulto que vislumbra
O teu andar apressado não atina, fico muda

No barulho atroador das palavras que atiço
Recatos desaparecem na penumbra
Mortiça de um bom dia airoso e atiradiço


sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Manhã

O ar da manhã
Trás saudade
Com ele odor
A pele
Trás o som
Dos passos
Que a dor repele
O sabor
De um beijo quente
No ar presente.

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Finta

Abrigo fustigado aos ventos
Nos recantos majestosos
Perdidos nos filamentos
São teus olhos caprichosos

São estrelas da manhã
Fio de água da chuva
Pecados de rubra maçã
O fino mosto da uva

São teus olhos caprichosos
O bailar em campo aberto
Nos caminhos tortuosos
Por uma sombra encoberto

Nesses olhos eu descubro
O carácter de uma vida
Bem que tentas ficar mudo
Mas o teu olhar te finta.

sábado, 17 de setembro de 2011

Errante



Ah, trouxeste a sede de reviver
Contigo trouxeste o olhar cálido
Dos homens da terra
Trouxeste no grito contido
Em cada linha o sentido
Da espera
Desnudada num fonema
A uma voz ou vintena
No ondular da ceara
Trouxeste cestos de verga
Açafates de desejos
Cabanejos de ensejos
Milheirais e arraiais
Também vieram as ceifas
Azeitoneiras e ganhões
Vieram até mondadeiras
Contigo trouxeste visões
Que retenho na lembrança
Dos meus tempos de criança
Errante por entre aflições.




Infiel


Há muito que não clamo amor
Não um amor qualquer
Amor sábio feição de malmequer
Alentejo, terra gente e odor

Odor a lágrima trancada
A sete chaves aferrolhada
A penas que se querem brancas
Para passarem despercebidas
No agreste do campo finto
 Além do infinito que o olhar alcança
Lágrimas trocadas por esperança
Surripiadas ao pó

Sabor a gente só
Amparada ás lembranças
De um destino muitas tranças
Feitas de espigas doiradas
Homens de rugas rasgadas
Mulheres de costas curvas
Pelo peso do viver
Numa terra que é fiel
Ao barro infiel
Que se desfaz com a água
Sempre que cai a chuvada
E o torna em cor pastel




quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Sangra


Sangra uma dor vadia
implora ao veio:
Verte as gotas
de uma só vez...
Que por sua vez
corre surda
altiva e vilã.
Ai coração
Sacias-te constantemente
nesse vermelho tingido
pela resignação!

Mente



Num dia como o de hoje
A mente é espadachim
Arremessa desilusão e foge
Ai de mim.

Como me perco
Para logo me encontrar
Numa arruaça premeditada
Olha ali um espreitar
Uma janela imaculada
Um segundo de atenção
Um sorriso que tanto fez
Mente insaciada e mordaz
Tudo julgas e pelejas
Nem reparas na altivez

Lembras recheio de um velho cabaz
Ou então o leito vazio de um rio fugaz

domingo, 11 de setembro de 2011

Naturalmente

Que bom seria se ouvisses o significado
Das palavras que grito, que bom seria
Se te perdesses no significado que desdenho
Se me trouxesses pedaços constituídos
Pelo amealhar do brado em que insisto

Por vezes penso que pensas em mim
Como flor de papel que o sol desbota
Amortecer simplório dos meus receios
Amontoar escorregadio de desejos
Um bafiento ar que me acalma
O grito que rola desprotegido

Impresso nas palavras está o âmago
Assim como no fundo do poço brota a água
Que bom seria se o tempo fosse menino e moço
Encontraria na sombra o refugio
Brincadeiras ardilosas da juventude

Se te perdesses no significado das palavras
Ignorarias o ruído da rotina, e a faxina
Aconteceria naturalmente.

domingo, 4 de setembro de 2011

Nada mais

Nada mais quero que sentimento
Nas palavras deitadas fora
Não serão elas consentimento
No reboliço da vida fora

Nada mais quero…

Os olhares mesmo sombrios
São ventania que logo passa
Espuma na praia
Maré vazia
Tala de gesso
Amparando a alma

Nada mais quero…

Que andar em frente
Pelo chão ficam as mágoas
Nada mais são
Que farrapos soltos
Que se desfazem em pó
Cursor um tanto atrevido
Como no moinho as suas Mós.

Calmaria

O que é este pressentir aguado
Contrastando com espécie de farrapo
Que se chega

O que é o ímpeto de relance
Que me diz não é o que parece
Está tudo mal 

O que são dias e noites
Sem bravia tosca calmaria
Onde o meu espírito reclama

O amanhecer nos teus braços
Na manhã calma.

sábado, 3 de setembro de 2011

Agua e suor

No encontro com o eu
Encontro uma mistura solúvel
Um misto consolado de correr
Sem ser alcançado

Então o desencontro
Na procura insidiosa
Que me leva para longe

No retorno encontro
O eu encostado ao tronco
Que é o pilar empolgado

Do poema inacabado
Um misto de amor e fel
Agua e suor açucarado 

Penhasco

Juntos no subir compassado
O mesmo olhar por vezes se distancia
Logo ali o caminho abrevia
E o poema cai desfolhado

Edificam-se eiras
Por onde os sonhos levitam
Os sentires exercitam
Entre formas e maneiras

Mas são tão solitários
Ás vezes doem-lhe as chagas
Não são suas as mágoas
São operários

De sentires em construção
De penas, alegrias em muitas mãos

Os poetas são o penhasco
De onde a vida se joga sem relutância

Espera

Antevejo o teu andar apressado
As pedras da rua soltam suspiros
Até os pombos no telhado
Desprendem-se voando

O coração bate compassado
Sorri o dia que chama p`la tarde
Enrosco-me no sofá esperando

O som dos teus passos
Está mais perto
Subindo o degrau um beijo decerto

Galgando p`la boca o coração animado

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Escrita Trocada: «« Carrapatos colados na alma ««

Escrita Trocada: «« Carrapatos colados na alma ««: Vejo e revejo
E não me reconheço
Perdi-me em dia de vento
Perdi pedaços no tempo
Esqueci o endereço

E agora…
Onde larguei o meu ser
Já não consigo enxergar
Nas rugas que vão vingando
Já não consigo encontrar
Os trilhos que fui pisando

Olho-me sem ver, cismando
Não reconheço os traços
Que teimam em mostrar
As marcas da vida
Ao passar…
Os amores por amar,
As raivas por acalmar
Os medos que teimei
Em não mostrar

Marcas nuas de sentimento
Que teimam em vingar
Parecem carrapatos
Colados na alma
Manipulam o silêncio
Que quase sempre me embala
Extravasam em doloroso sentir
No meu intimo a zunir

Que sou pedra por moldar
Pedra dura a teimar
Rolar, rolar
Sem o tempo ver passar
Sem trave para me agarrar.


Apressado

Hoje deixem-me pousar a cabeça
Na ombreira da porta. Velha
De uma caducidade gritante
Persiste contra ao vertente
Onde o alumínio perdura

Que hoje possa descair o olhar
Sobre as letras tortas
Habilidade visionária
Breve e passageira. O condão
Desponta nas letras rasas
Tenho tanto que aprender
Na curvatura das costas
Que impelem o sondar

Porque hoje o Outono se avista
Quero olhar de frente o velho
O novo perde caducidade
Na falta de humildade
De um passo à frente das pernas
O velho arremata são lanternas
Que safam o apressado 
De um sonhar alpinista.

Palavras ao Vento Suão, Antónia Ruivo